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Six Organs of Admittance / Joanna Newsom
Lux, Lisboa
21/04/2005


Quando, a 9 de Junho do ano passado, Ben Chasny actuou na cidade do Porto, só não espantou meio mundo porque já lhe conhecíamos o génio, o talento; já lhe conhecíamos discos estupendos como For Octavio Paz, Dark Noontide e Compathia. Mas agora, School of the Flower - disco que marcou a estreia de Ben Chasny pela Drag City - meteu-se pelo caminho do panorama Six Organs of Admittance, e agora as coisas são um pouco diferentes. Primeiro porque este último registo parece-se basear-se bastante – talvez mais do que nunca – nas palavras, e segundo porque Ben Chasny confessou já pensar em concentrar a sua actividade musical noutros instrumentos que não a guitarra acústica, o que faz com que esta possa ter sido uma das últimas oportunidades de assistir a um concerto que reflecte a paixão pelo legado de guitarristas como John Fahey ou Robbie Basho. Como não podia deixar de ser, School of the Flower foi o percurso que Chasny mais vezes percorreu. E os resultados, embora não sejam tão fascinantes como foram no concerto no Mercedes, no tal dia 9 de Junho de 2004, são recompensadores. Apesar de o sítio não favorecer obviamente o ambiente criado pela sua música (o calor sufocante, por momentos, impossibilitava que se pensasse noutra coisa que não na temperatura, pela gritante falta de ventilação do local), uma actuação de Six Organs of Admittance é coisa para deixar saudades dois segundos após o seu término. Muito mais quando se acaba um concerto com a belíssima “Lisboa”, um tema que encerra em si mesma tanto a sombra como a luminosidade que a cidade sugerida ostenta. É apenas lógico que “School of the Flower” surja nos lugares cimeiros das listas de melhores discos de 2005.

Six Organs of Admittance © Ana Silva

O ano que antecedeu este até agora promissor 2005 viu nascer uma das maiores coqueluches da bem vinda nova vaga da música folk: Joanna Newsom. Depois de ter editado dois EPs, Walnut Whales e Yarn and Glue, o lançamento do surpreendente The Milk-Eyed Mender - assim como a inclusão de um tema na compilação The Golden Apples of the Sun, documento da responsabilidade de Devendra Banhart – dividiu críticos e ouvintes, e muito por culpa da sua invulgar voz. Talvez pela dificuldade de descrever o que faz – a própria, em entrevistas, tem alguma dificuldade em descrever a naturalidade da sua música - as comparações feitas à música de Joanna Newsom florescem de dia para dia, sem sinais de daí brotar um feijão mágico. No entanto, arrisco uma: é como se a Björk, nos seus seis anos, fosse para os bosques com Zeena Parkins e a sua harpa. Não é muito vulgar, mas a verdade é que acontece. Joanna Newsom, harpista treinada desde longo tempo, ensaia uma das suas canções a cappella junto do público que a acompanha com palmas, e depois apresenta-se em palco para se sentar junto à majestosa harpa que havia de manejar em todas as canções. Desde aí, sabia-se, Joanna Newsom havia conquistado a atenção do público, pela sua graça, pelo seu jeito de menina – até porque tem ainda apenas 22 anos. O vestido retirado do filme “Música no Coração”, a aura de pureza que transporta, a sua beleza invulgar e a quantidade reduzida de vezes que se vê uma harpa ser tocada ao vivo também ajudaram bastante. Havia de rever então as canções de The Milk-Eyed Mender quase de uma ponta à outra com a graciosidade que lhe é reconhecida e com a ajuda de uma amiga de longa data que preencheu algumas das suas canções com flauta. “The Book of Right-On”, “Peach, Plum, Pear”, “Bridges and Balloons”, “Sadie” e “Cassiopeia” e até, perto do final, “Inflammatory Writ” a pedido do público. Canções novas, canções antigas, canções menos antigas, canções eternas. Um encore e ainda mais outro, o segundo, quando a música no Lux já tinha disparado e se previa o fim, e até alguém que sobe ao palco para entregar um ramo de flores a Joanna Newsom. O concerto foi longo, e a devoção imensa. E outra coisa não seria de esperar. Tivesse acontecido noutra sala que não o Lux e estaríamos aqui a falar de mais do que um grande concerto.

Joanna Newsom © Ana Silva

André Gomes
andregomes@bodyspace.net
21/04/2005