Vampire Weekend: Quando África chegou ao indie
· 29 Jan 2018 · 17:54 ·
Estávamos em 2008, as discussões em torno de "apropriação cultural" ainda não tinham sido amplificadas por um bando de palermas nas redes sociais e tudo o que era blogue ou website de música estava doido com isto. Falamos de Vampire Weekend, o excelente álbum de estreia da banda com o mesmo nome. Mas até nem estávamos em 2008; estávamos no final de 2007, e já o álbum tinha chegado ao saudoso Rapidshare e aos ouvidos de quem estivesse atento ou circulasse pelo /mu/, no tempo em que o 4chan ainda não estava (muito) pejado de cabrões neo-nazis...

No espaço de apenas um ano, os Vampire Weekend cresceram e rebentaram com uma bolha indie sempre predisposta a encontrar a sua próxima salvação. A música era, claro está, a principal culpada. Porque, mesmo que o quarteto nunca tenha deixado de ser um grupo de betos burgueses em escolas ricaças, conseguiram fazer disso algo fixe - como os Strokes, no início da década, ou a new wave dos anos 80. Porque traziam algo novo que ainda não tinha chegado ao indie rock, e que até então tinha o seu expoente máximo no Graceland de Paul Simon: uma distinta influência dos sons de África.



Vampire Weekend foi o primeiro passo para que surgissem, nos anos subsequentes, artistas como os Tune-Yards ou os Fool's Gold. Foi a porta de entrada de muita gente para a música que se fazia em África, longe do mainstream, e que transformou depois os Konono Nº1 em estrelas subterrâneas ou popularizou blogues como o Awesome Tapes From Africa. E foi, acima de tudo, um grande álbum, repleto de canções literatas e gostosas, de referências e autorreferências, de e para fãs tanto de T.S. Eliot como de Lil Jon. Mesmo quem não as percebeu não deixou de achar piada, imensa piada, a uma das mais bonitas frases que o indie nos deu após a virada do milénio: Who gives a fuck about an Oxford comma?

Se 2008 foi o início da falência do indie (2007 deu-nos, ora contem lá, discos dos LCD Soundsystem, Arctic Monkeys, Klaxons, Arcade Fire, The National...) foi também o ano em que começámos, empurrados por bandas que faziam as coisas de forma menos anglocêntrica, a percorrer outros caminhos. E parte da culpa é dos Vampire Weekend, de "Oxford Comma", de "Cape Cod Kwassa Kwassa", de "A-Punk", hoje temas mais ou menos clássicos - ainda que a melhor canção de sempre dos norte-americanos seja "Diplomat's Son", hoje e sempre. Numa era em que se começava a descobrir o potencial imenso da Internet para sacar música de todos os quadrantes do planeta, da mais popular à mais obscura, os Vampire Weekend deram o mote para todo o jovem melómano digno desse nome.



Ensinaram que o pop/rock existia, sim, mas também ensinaram que se podia ser punk em Soweto, que se podiam ouvir discos de Madagáscar no CBGB's, que há dúzias de guitarristas africanos tão bons quanto Jimi Hendrix e que o techno nasceu algures no Burundi. Ensinaram - abrindo as fronteiras e apontando o caminho até à fonte, não apenas pilhando e fechando a fronteira - que havia muito por descobrir. Vampire Weekend foi a sua lição; quatro putos betos, mas não de raízes WASP, a aproximar-nos todos mais um bocadinho. Não é maravilhoso quando isso acontece?
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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