Qualidade precisa-se!
· 28 Abr 2003 · 08:00 ·
No início de Abril o jornal Público, e na rubrica “Barómetro”, levou a cabo um inquérito onde a temática era a rádio e a música portuguesa. A pergunta que o diário colocava aos seus leitores era: “Concorda com a imposição, por lei, de uma quota de 40 por cento para a música portuguesa nas rádios?”.

Os resultados não surpreenderam e, uma vez mais, vieram demonstrar que neste assunto há uma clara divisão entre as pessoas. Num total de 4.314 votantes, 51 por cento defendeu o “não” contra os 48 por cento do “sim”. Uma margem mínima, não representativa do todo mas, por outro lado, um espelho da realidade.

Relativamente a este assunto urge colocar uma outra questão. Quem defende a obrigatoriedade de uma quota para a música portuguesa nas rádios? Se formos a olhar para as caras que fazem parte das associações e movimentos espontâneos que defendem a tal imposição de uma quota, somos confrontados com músicos em idade avançada ou que já deram provas do seu valor num passado recente. A “velha guarda”, como alguém ousou chamar-lhes, é a verdadeira impulsionadora deste movimento singelo. No entanto, não deixa de ser relevante o facto de, e através de várias conversas com os músicos da nova geração, verificar que estes não concordam com esta imposição. Ao contrário dos colegas mais “experientes”, são a favor da música portuguesa na rádio segundo parâmetros de qualidade. Um argumento de peso e inquestionável revelando, ainda, uma sensatez e dignidade de louvar.

Durante décadas, e antes do 25 de Abril de 1974, os músicos portugueses (para não falar de todas as classes da sociedade portuguesa) contestaram a falta da liberdade de expressão. Depois da Revolução dos Cravos abriram-se as portas da liberdade e, até meados da década seguinte, a música portuguesa revolucionou-se para, com base na criatividade, conhecer aquele que poderemos apelidar de período áureo musical. Mas nos cerca de quinze anos que se seguiram, e salvo raras excepções, os sons nacionais pareceram ter ficado parados no tempo. Não se acompanharam as evoluções musicais e ficámos para trás. Actualmente sentem-se os resultados desse vazio mas, e por estranho que possa parecer, são os “responsáveis” por esse afrouxamento da música portuguesa que defendem a imposição de uma quota obrigatória.

Portugal é conotado como um país democrático. Nesse sentido é credível o desejo de imposição, seja ele qual for? Numa democracia é a maioria quem mais ordena. E será que a maioria é a favor dessa imposição? Não deveríamos ser suficientemente orgulhosos ao ponto de não querermos “pequenos favores”, mas sim a impormo-nos pela nossa qualidade?

O músico ao ouvir as suas canções nas rádios deveria querer pensar que as ouve por terem qualidade, e não ficar na dúvida se é por isso ou porque se tinha que ocupar espaço, ou seja, cumprir uma lei.

Não se iludam. As rádios passam aquilo que as pessoas querem ouvir e a música que tem qualidade. Não é com mais do mesmo ou cópias que se consegue passar na rádio. É com imaginação e coisas novas. A palavra de ordem não deveria ser imposição, mas sim inovação. E existem coisas bem mais importante e urgentes que deveriam ser alvo de críticas e indignação da parte da comunidade musical, como o IVA do costume, a melindrosa aposta das editoras, o preço exagerado dos discos portugueses, dos instrumentos, estúdios, salas de ensaios e a carência (para não dizer ausência) de um circuito de salas de espectáculos. Isso sim, é que deveria preocupar todos.
Jorge Baldaia

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