OUT.FEST 2016
Barreiro
8- Out 2016
Novo ano, vida nova. O Out.Fest não é apenas uma montra para a alguma da música mais exploratória que se tem feito e continua a fazer; é também uma oportunidade para conhecer o Barreiro - e a organização faz por isso, espalhando os concertos por vários pontos da cidade. Pelo terceiro ano consecutivo, o dia mais preenchido decorreu num espaço diferente, neste caso a ADAO - Associação Desenvolvimento Artes e Ofícios, antigo quartel dos bombeiros no qual entramos e de pronto somos confrontados com uma overdose de arte - pelas paredes, pelas salas, pelos quartos, por tudo.

A música também foi uma das artes representadas, e começa com Polido, jovem músico que inicia o seu set com uma dose gostosa de noise ambiente e depois puxa pelo ritmo, primeiro industrial de dentes cerrados, com samples e drone a ajudar, depois indo buscar ao hip-hop e à música mais dançável, num aquecimento para o que se seguiria: o cruzamento (ou casamento?) entre Hans Joachim Irmler e Jaki Liebezeit, ex-Faust e ex-Can respectivamente. E se a história era um motivo muito forte para acompanhar de perto aquilo que trariam à Margem Sul esta noite, a realidade trocou-lhe as voltas: sintetizadores viajando estrada fora, ritmo tribal ora hipnótico ora acelerado, um sonho hippie que, lamentavelmente, soou melhor no papel que ao vivo. Foi pena.

Felizmente os sonhos são feitos também de guitarras: as dos Acid Mothers Temple, que entram em palco com um tímido are you ready?, cortesia dos longos cabelos brancos de Higashi Hiroshi, guitarrista a tempo inteiro e Buda nas horas vagas - foi a sua a garganta que mais se ouviu em meditação logo após o espalhafato noise que se sucedeu ao cumprimento. Perante um público bem composto, e mesmo sem se conseguir vislumbrar um bode do que se passava em palco dado este ter sido colocado tão baixo, os Acid Mothers Temple descarregaram psicadelismo pesado sem espinhas ao longo de uma hora e meia, ou quase, num concerto que nos fez sentir - uma vez mais - que Deus existe e está nas seis cordas. Um solo de harmónica permite a dança sensual de um travesti enganador; ouvem-se os Black Sabbath, evidentemente - via "The Wizard" -, e o lick maravilhoso de "Pink Lady Lemonade"; sente-se estarmos na presença de um vulcão completamente insano, a cuspir ácido por todos os poros, e ginga-se o corpo ao som de um groove elástico que lá vai aparecendo. No final, a guitarra pendurada por Kawabata Makoto não nos deixava mentir: do caralho.

Dividindo-se os concertos por outras salas, fomos picando e ali ao longo da noite - sem permanecer muito tempo no mesmo sítio - e terminamos com o techno segundo Hieroglyphic Being, que arrastou fãs fiéis de todos os cantos do Tejo para mostrar por que motivo é considerado um dos produtores mais, vá, interessantes da actualidade. Ouviram-se alguns motifs árabes, muito acid, observou-se um ou dois momentos de roça-roça e fumou-se muita, muita coisa. No final, fica o desejo de que volte para actuar, desta feita, em sala fechada: foi giro, mas não foi um suadouro exaltado.
· 11 Out 2016 · 22:23 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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