OUT.FEST 2015
Barreiro
8-11 Out 2015
Dia Três Terceiro dia de concertos no Barreiro, agora abrigados da chuva na indescritível ADAO. Ocupado pelo que calculamos serem artistas locais, o espaço é uma ode à liberdade e abriga desde instalações a pinturas ou esculturas e, claro, concertos. Como uma espécie de labirinto que a cada curva esconde uma surpresa, a ADAO já é o melhor espaço de sempre do Barreiro.

Não podemos deixar de lembrar que o esforço messiânico da organização para levar a cabo 14 (!) concertos em pouco menos de seis horas, obrigou a um lufa-lufa constante para acompanhar as sucessivas actuações. E se isso retirou parte da dimensão contemplativa em que o Out.fest opera, não é menos verdade que o leque de escolhas (e consequentemente o público) aumentou exponencialmente.

Olhando para trás, este dia do Out.Fest passou-se quase como um plano sequência de acção infinita, que abriu com a pequena maravilha oculta que é Black Chant Myth, fechou com o misticismo dos Alförjs (diga-se desde já que deram o melhor concerto do festival) e foi sendo decorado com cores, ritmos vários e expressões tão inesperadas quanto aguardadas por toda a gente. Neste último cabem os Gala Drop e os Golden Teacher, que antes de subirem ao palco já concentravam grande parte das atenções no Palco Oficina. Ambos contagiantes, com música que aponta ora à pista de dança, ora à viagem (sempre com doses bem grandes de psicadelismo), deram dois dos concertos mais concorridos e onde mais se dançou e suou à laia das horas que iam avançando calmamente.

No andar de cima, fintadas as dezenas que se acumulavam nos corredores, escadas e bares, Peter Brötzmann e Jason Adasiewicz faziam o Salão Nobre levantar voo. Num concerto mais concreto e de estrutura mais óbvia que aquilo que se podia esperar, ficou bem clara a química entre o veterano e o vibrafonista norte-americano, num diálogo maioritariamente melódico que esperamos rever em breve.

Uma hora antes disso, os Zs subiam ao Palco Oficina para um concerto que não foi consensual. Quiçá prejudicados pela falta de alguma intimidade, os Zs nunca foram capazes de impor a introspecção que a, espaços, a sua música carrega. Mas valeu a arritmia inquietante da guitarra de Charlie Looker (quando é que alguém traz os seus Extra Life?) e o saxofone arisco e por vezes bem catchy de Sam Hillner. Decididos a deixar para trás os Zs, subimos ao andar de cima para confirmar que, apesar dos contratempos típicos desta fase da carreira, Cotrim é mesmo feito de crueza, ritmo e muita vontade de trocar as voltas à música de dança.

Com os corredores cada vez mais apertados e as horas a passar tão rápido como os concertos da noite, a indeterminação de Low Jack e Russel Hasswell foi facilmente trocada pelo sossego da linha férrea nas traseiras da ADAO. De lá só voltamos a sair para nos banharmos na distorção impiedosa de Filipe Felizardo. Ao longo de meia hora, o guitarrista apresentou a sua casta muito peculiar e eléctrica onde a folk, o blues e o drone andam de mãos dadas, abrindo o apetite para o consumo imediato do seu vindouro Volume IV: The Invading Past and Other Dissolutions.

Quando a Sala de Jantar se preparava para receber o concerto dos Alförjs, ainda era bem audível o entusiasmo gerado pelos Golden Teacher e a cacofonia dos Caveira mesmo ali ao lado. Nada que impedisse o trio lisboeta de se atirar a uma actuação implacável, que abafou todos os ruídos exteriores para hipnotizar os que ali se reuniram para os ouvir. Definir a música dos Alförjs é um desafio tão grande como ouvi-los. Há por aqui tanto de jazz como de metal, como de uma folk muito freak. E talvez seja isso mesmo que eles querem, criar uma massa tão indefinível cujo único objectivo é o de libertar através da música. Seja o que for que nos faz gostar tanto deles, o certo é que os Alförjs são a banda que precisamos de ouvir uma e outra vez. E só pelo bom que foi vê-los, temos mesmo que agradecer ao Barreiro. António M. Silva
· 22 Out 2015 · 01:51 ·
António M. Silva e Paulo Cecílio

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