Vashti Bunyan / Flo Morrissey
St Philips Church, Manchester
12- Out 2014
Vashti Bunyan, e o seu colega de estrada Gareth Dickson, sentaram-se, com as suas guitarras acústicas, sob a égide de um quadro d’A Última Ceia. Se o novo Heartleap é, de facto, a despedida musical desta senhora de 69 anos, há uma simbologia curiosa nessa disposição de palco. A principal diferença é que nenhuma das pessoas de várias idades sentadas num silencio de admiração pensaria sequer em trair a confiança daquela que durante tantos anos foi apenas um murmúrio perdido na história musical.

© Andy Salmon

Antes, porém, referencia a Flo Morrissey, cantora que, também sozinha com guitarra – e ao órgão em 2 músicas – abriu o concerto. De apenas 18 anos, mostrou algum potencial nestas coisas dos formatos minimalistas, com uma voz que, quer nos tons mais baixos, quer nos falsetes, tem algo de Hope “Mazzy Star” Sandoval. E canções com boa estrutura, melodia a dar para a folk semelhante a cabeça de cartaz, e refrões capazes de merecer alguma atenção. Não disfarçou alguns nervos de palco, e o seu falsete “parte-se” por vezes. Mas não deixou de ser uma primeira parte competente, e bem recebida.

© Andy Salmon

Quanto a Vashti Bunyan, é daquelas cantoras paradoxais. Apetece usar todo o tipo de clichés para descrever a sua música. Frágil, encantada, delicadíssima, fresca como o orvalho matinal. E tudo isso parecer a mais absoluta verdade. Canções destas são demasiado simples, vivem das melodias mais puras, para que faca sentido elaborar uma série de rococós para as caracterizar. A sua voz, praticamente um sussurro agudo, é um maravilhoso assobio no meio do silencio. Uma gravação pirata deste concerto haveria de apanhar o som de latas de cerveja a serem abertas. Felizmente, Vashti manteve-se imperturbável, concentrada nas letras e melodias que compôs ao longo da sua vida. E como são perfeitas, certeiras e intemporais estas últimas.

© Andy Salmon

Todas as canções tem direito a história introdutória. A maior parte são sobre a sua vida. Aspirações, cenários, filhos, etc. Ironias da vida: “Wayward” foi composta quando Vashti era jovem mãe, e desejava que os filhos saíssem de casa e pudesse voltar a tocar as suas canções na estrada. E é precisamente aí que se encontra agora. Por vezes, Dickson faz harmonias, como em “Across The Water”. “Here Before” abriu o concerto, com as guitarras aparentemente tão “robustas” como um fio de teia acabado de segregar. Quando Vashti anuncia “I’d Like To Walk Around With You”, ouve-se um ”woo muito baixinho. Será, portanto, o seu hit. No total foram 13 canções, com um único encore na qual tocou a nova “Heartleap” (tema-título do novo disco). E, se possível, ainda soa mais simples que as antigas. Não deixa é de ser mais uma tremenda canção. O aplauso de pé, no fim, e a cara, ainda embaraçada, de Vashti Bunyan, disseram tudo. Por mais ruído que o mundo tenha, melodias destas hão-de sempre encontrar espaço.
· 13 Out 2014 · 11:20 ·
Nuno Proença
nunoproenca@gmail.com

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