Rock in Rio Lisboa
Parque da Bela Vista, Lisboa
29-01 Jun 2014
E pronto: chega-se ao fim do Rock In Rio com a sensação de dever cumprido. Milhares de pessoas circularam pelo parque da Bela Vista ao longo de cinco dias de festival, angariando milhões à organização e colocando o nome Lisboa no mapa. Tudo isto com o mínimo possível de música; o que importa é que haja slide, roda gigante, brindes a cada esquina e cerveja a três euros e meio. "Rock" aparece como adjectivo, como forma de marketing. O resto que se foda, que o povo gosta, adere e está cá é para isto.

Mas há que dizer que dentro deste ambiente que faria Marx dar voltas no túmulo ainda existem momentos de caos adolescente - os Linda Martini, por exemplo, cujas guitarras continuam a dar a volta à cabeça de muito puto que por esta terra se passeia. Como não ficar comovido com aquelas canções hoje clássicos que em 2005 fizeram com que nos apaixonássemos pelo quarteto, um "Amor Combate" que perdura mesmo que Turbo Lento não tenha correspondido às expectativas? São grandes e vieram a um festival grande: faz todo o sentido. Tocarem "Panteão" e não a dedicarem ao Nuno Dias da Internet é que não. Mas não se pode ter tudo.

A vontade de ver Mac Miller era pouca ou quase, mais por desconhecimento que por desgosto, mas a verdade é que o rapper repescado à última hora colocou milhares de braços a cirandar pelo ar com recurso aos bons beats que o DJ ia sacando cá para fora, já que a voz e as palavras sumiam perante a torrente de ruído e o sotaque white trash do norte-americano. Ainda assim, é bom ver que um espectáculo de hip-hop ao vivo pode transmitir o mesmo grau emocional que se tinha com o punk: uma vontade enorme de abanar o corpo. Provavelmente não teria acontecido caso os Chic tivessem realmente vindo. Ou seja, uma aposta claramente ganha. Que falta faz mais do género em Portugal.

De Justin Timberlake esperava-se o universo - porque era a estreia no país, porque íamos todos lá, porque regressou à música (à *boa* música, a qual sempre fez) no ano passado com tomo duplo de The 20/20 Experience. Em espectáculo de hora e meia ou pouco mais, acompanhado pelos Tennesse Kids e fazendo meia Bela Vista guinchar de gozo púbere quando dava corda aos sapatos, Justin Timberlake oscilou entre o médio e o bom, num momento em que deveria ter sido excelente (muitas outras vozes, contudo, discordarão: francamente justo). Abrindo com "Pusher Love Girl" quando a qualidade sonora ainda não era a melhor e chegando à enormíssima "My Love" pouco tempo depois - um dia haveremos de pedir alguém em casamento ao som disto, até lá treine-se o falsete -, Timberlake foi atingido o pico de excitação em vários momentos mas baixava logo de seguida quando o que se impunha era uma estadia no topo durante tanto tempo quanto aquele em que nos permitisse observar de perto a sua face (ou estatuto, entre os mortais, já que até arriscou uns versos de "I Am A God", do amigo Kanye West). "LoveStoned" e "Señorita" foram, por exemplo dois desses momentos, bem como a indispensável "Cry Me A River". Ao longo da Bela Vista iam-se observando pequenos pontos de caos aqui e ali: passos de dança mal amanhados por via do álcool, caixotes do lixo derrubados a ajudar os menos dotados fisicamente e imensas luzes de telemóvel a abrilhantar ainda mais o primeiro concerto de Timberlake por cá. Coube uma versão de Elvis ("Heartbreak Hotel"), mas não coube "Tunnel Vision" ou "Let The Groove Get In", falhas a nosso ver gravíssimas. Podia ter tido o mundo inteiro, mas preferiu conquistar apenas a noite. Take back the night, indeed. Que volte cá e à segunda tiraremos as teimas.

Poder-se-ia ter acabado por aqui o festival, mas o Rock In Rio só terminaria realmente por volta das quatro horas da manhã quando os regressados Underground Sound of Lisbon regressassem para um curtinho set de uma hora em que brindaram os resistentes com o que de melhor se fazia nos anos noventa do techno; não se percebeu foi porque razão teve de ir Zé Pedro dos Xutos dar ali um ar de sua graça, porque se era para tocar uma ou outra nota na guitarra haveria músicos na baixa lisboeta que cobrariam mais barato. Pouco importa: o festival termina com o balanço frenético desse malhão enorme que dá pelo nome de "So Get Up". E é mesmo isso: há que levantar e preparar o futuro. Para já esse futuro chama-se Primavera Sound.
· 05 Jun 2014 · 23:14 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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