Festival Sudoeste 2005
Zambujeira do Mar
04-07 Ago 2005

Palco Planeta Sudoeste
The Vicious 5 · Mata tu, Patrón! · d3ö · Wraygunn · The (International) Noise Conspiracy · The Kills
Palco TMN
Doves · Dinosaur Jr. · Basement Jaxx


Palco TMN

Doves
Depois de um concerto morno, mas simpático, por parte dos também britânicos Athlete, a “tradição” de Manchester voltou ao palco principal (onde já tinham passado os Oasis). Jimi Goodwin tem um visual entre o Kurt Cobain e o Badly Drawn Boy e uma presença de palco que não compromete, mas que ficou conotada com a alegria de estar em... “Spain”. Ainda corrigiu antes de terminar a frase, mas os assobios foram imediatos.
Em disco são uma banda com boas canções, mas parecem perder muita da sua vitalidade quando as tocam ao vivo. As músicas de Last Broadcast entediam naquele palco, talvez por falta de ambiente: tiveram uma plateia reduzida e poucas palmas. Na recta final melhorou um pouco, e concluíram com um público bem mais satisfeito que durante grande parte do concerto. T.G.

Dinosaur Jr.
Os Dinosaur Jr. chegam. J. Mascis está estupidamente velho, com cabelo branco comprido e com uma barriga indesculpável. Veste um casaco Adidas roxo. A sua voz envelheceu extremamente mal, os seus solos de guitarra só raramente é que têm o vigor e o poder de antigamente. As malhas, as verdadeiras malhas, são poucas durante a hora em que eles tocam. É uma reunião que acaba numa desilusão, onde o péssimo som não estraga tudo, a banda trata de estragar. Apenas Lou Barlow se safa, o baixista que voltou a juntar-se a J. Mascis depois de anos de zanga. A sua voz sempre foi claramente superior à de J. Mascis, mas quando se põe a cantar hoje em dia ganha-lhe por KO absoluto. É o único que aproxima o concerto dum espectáculo, agradece a toda a gente por esperar pelos Korn por eles. Talvez tivesse sido melhor terem ficado quietos, para aquilo ficávamos em casa a ouvir os discos e o mito nunca teria sido desfeito. Pelo menos não começaram à porrada, se bem que isso teria dado um espectáculo mil vezes melhor. R.N.

Dinosaur Jr.

Basement Jaxx
Alguém entre o público dizia que um concerto de Korn é um pouco como uma crise económica: uma merda que nunca mais acaba. Não foi pois de espantar que muita gente, depois de quatro dias de muito cansaço, abandonasse o recinto sem esperar pelo concerto de encerramento. Foi então com pouco público (mesmo assim, a zona envolvente ao palco estava cheia) mas com muito fervor que os Basement Jaxx assomaram na Herdade da Casa Branca com um dos melhores concertos no palco principal. Com vários vocalistas, que muito se esforçaram para puxar as pessoas, uma panóplia de instrumentos que enriqueceram a actuação (os sopros, principalmente) e efeitos de luzes que também contribuíram para o espectáculo cénico e espantaram quem pelo nome não os conhecia. Foi quase deixado de fora o último Kish Kash para dar prioridade aos álbuns de 1999 e 2001, Remedy e Rooty. “Red Alert”, um dos singles principais do primeiro disco e a música mais conhecida da banda, foi o momento alto da noite. T.G.

Palco Planeta Sudoeste

The Vicius 5
Os The Vicious Five venderam-se. Assinaram pela Loop, uma editora de hip-hop. Mas, em vez de irem pelo caminho fácil das putas e do bling bling, apenas tornaram a sua sonoridade menos hardcore e mais rock’n’roll. Há agora falsetes e solos de guitarra. Continuam, contudo, com a mesma pose, com os mesmos riffs monumentais, o mesmo jogo de guitarras e o carisma de Joaquim Albergaria, o vocalista.
“A festa acabou” é o que se declara no início. A próxima hora será dos The Vicious Five. Temos um vocalista com uma T-shirt de Joy Division que vai dançando nervosamente, se bem que duma forma bem mais hedonista que Ian Curtis, vai saltando, vai trepando o poste, vai saltando à corda com o microfone, vai fazendo um jogo de pés invejável, tem espasmos incontroláveis, sabe-se lá mais o quê. Vai, sobretudo, dando um grande espectáculo, que só sofreu por ter sido às 5 da tarde e o público não estar ainda aquecido. Por isso e pelo mau som do baixo, bem como os problemas com as guitarras. Grita-se “We want to rape you back” no tema “The Smile on Those Daggers”, faz croché de palco, desenrolando-se os cabos do microfone e da guitarra, há um cowbell em “Suicide Club”, tema sobre estar vivo e mostrar que se está vivo, há um espectáculo que rocka pra caraças. E só há expectativa para ouvir Up on the Walls, que sai em Setembro pela tal editora de hip-hop (que é independente, logo o “venderam-se” do início é a brincar). R.N.

The Vicious 5 © Rui Velindro/A Cabra

Mata Tu, Patrón!
Os Mata Tu, Patrón são a nova banda do baterista Kinörm dos Ornatos Violeta e de Rui Gon dos Zen. Praticam um rock desinteressante, com aproximações ao grunge ou lá o que é, dizem coisas como “É uma questão de tempo, isto um gajo um dia mata-os todos” ou “Façam barulho, caralho! Então, caralho, ‘tão a dormir?” Nada de especial, ou seja, uma verdadeira desilusão, vindo de quem vem. R.N.

Mata tu, Patrón!

d3ö
Apesar de serem a menos interessante das bandas que nasceram das cinzas dos Tédio Boys no activo, os d3ö são uma banda rockante para caraças. São rápidos, curtos e pungentes, mesmo que o seu concerto dure um pouco demasiado tempo. Tony Fortuna é um excelente frontman, com loucura, carisma, e cheio de pinta, foi membro dos M’As Foice e tem a escola toda. “Viemos de Coimbra só pra vocês, fizemos uma viagem maravilhosa”. A música é básica, primitiva, grita-se “Hey hey” e bate-se o pé ao som de “Ice Cream”, um tema para o verão. O princípio é bom, o meio é mais ou menos, mas o fim... no fim Tony pede a tudo para tirar a T-shirt, para andar com ela à roda, como um sinal de libertação. A música arranca e pára, pede-se braços no ar e ancas a mexer. Tony trepa ao poste, abraça tudo e todos, deixa-se cair para trás e é basicamente isto. Mas é muito bom. R.N.

Wraygunn
“Soul” é a palavra chave. E não é só por estar escrita no peito de Paulo Furtado. Depois dos d3ö, mais uma das bandas a sair das cinzas dos Tédio Boys. Supomos que, para quem nunca viu os Tédio Boys ao vivo durante a sua existência, isto deve ser o mais perto do suor e rock’n’roll e do exorcismo canibal dos míticos rockabillys de Coimbra. No entanto, para quem, como nós, já viu Parkinsons, d3ö, Bunnyranch e Wraygunn, estes últimos são os claros vencedores. Paulo Furtado é uma das maiores rockstars portuguesas, Raquel Ralha é uma das melhores vozes rock’n’roll portuguesas, um contraste doce para a sujidade rock’n’roll da banda e a banda é, toda ela, excelente. Um concerto dos Wraygunn é sempre um acontecimento inesquecível e imperdível, onde a banda dá o máximo para dar um bom espectáculo. Mas algo correu estupidamente bem naquela noite, não sabemos o quê, uma perfeita simbiose entre banda e público, toda a gente sabia as letras, toda a gente dançava, a banda estava em grande. Paulo Furtado saltava e dançava, chegou mesmo a ir para o meio do público ou a trepar o poste, Raquel Ralha cantava e encantava, a outra rapariga belíssima negra que canta com eles também, os músicos no seu melhor. Até Tony Fortuna é chamado ao palco, para uma brutal versão de “My Generation” dos The Who. É sempre bom ver ex-Tédio Boys a juntarem-se no mesmo palco.
É fácil ver, ao vivo, como os franceses andam a abrir os olhos para os Wraygunn. Já venderam 5000 discos num só mês por lá, receberam óptimas críticas, tudo. Quem não se rende ao gospel rock da banda é, sem dúvida, parvo. Qualquer banda que tenha duas mulheres perfeitas em palco, com vozes belíssimas, fazendo dois contrastes, um entre elas e a banda, doçura/dureza e outro entre elas as duas, preto/branco, merece o mundo. Especialmente se uma delas tocar cowbell. R.N.

Wraygunn

The (International) Noise Conspiracy
Afinal o rock é vermelho, como a roupa dos (International) Noise Conspiracy. Ou o punk, se na base deste está a contraposição ao capitalismo crescente: o concerto foi pejado de referências e discursos de combate, principalmente contra imperialismo e a indústria discográfica. Tocaram “Power To the People” e a pequena multidão que estava na tenda dançou com tantas forças quanto as que teve. Foi eléctrico, demasiado eléctrico: sem interrupções entre os temas (a não ser para uma ou outra palavra de ordem), sempre aos saltos de um lado para o outro. E, não por acaso, das poucas bandas do palco Planeta Sudoeste com direito a encore.
Problemas de ordem técnica afastaram o concerto de 2002 no Festival Carviçais, mas foi desta que se estrearam em Portugal. É caso para dizer que não podíamos esperar mais tempo: nenhuma expectativa saiu defraudada. Das colunas emanou tanto garage rock como soul, memoraram os Hives, esbarraram nos Stooges, evocaram o apelo sexual de James Brown e o conteúdo político das bandas que fizeram revoluções. Parecerá Portugal um país oprimido e afundado em capitalismo? Dennis Lyxzén, frontman da banda sueca, disse que em digressão já viajaram pelo mundo e que aqui percebeu exactamente que o público apreendia a sua mensagem. Ele lá saberá, mas ficámos sem perceber o que queria dizer. Só podia sair da boca dele as palavras “The perfect rock outfit would be a combination of Elvis and Che Guevara.”. T.G.

The (International) Noise Conspiracy

The Kills
Era uma das bandas mais esperadas no Sudoeste, também porque o ano passado em Paredes de Coura demasiados problemas técnicos marcaram a actuação. O epíteto de “dupla sexy” difundiu-se muito e por isso a curiosidade aguçava a vontade de ver o concerto. Ao vivo não deixam de ser só VV e Hotel, mas estão acompanhados por batidas de fundo. Não soa tão rock, mas mais chatinho, daí que as músicas em disco possuam uma chama que nunca foi atingida. Como agravante, as vozes estavam demasiado baixas em relação à guitarra e era difícil ouvir o que diziam, quanto mais compreender. Nunca cativaram completamente quem ali estava, não despertando mais do que um disfarçado entusiasmo. Têm um dos melhores álbuns rock do ano (No Wow) mas não foi isso que trespassou. Houve ainda uma certa dramatização rock’n’roll: a encenação foi prato forte, mas nem por isso acresceu interesse à noite. Raramente interagiram com o público, a não ser para agradecer os aplausos. Desafiaram-se um ao outro com o olhar, contracenaram em conjunto ou cada um para o seu lado, mas esqueceram-se que havia pessoas a assistir. T.G.

Foram quatro dias de música, de loucura, do que quer que fosse. Tudo num festival onde o parque de campismo não era um verdadeiro parque de campismo, onde havia barulho até às 9 da manhã, fosse dos djambés dos friques ou da música da MTV (nada de concertos), onde o sol começava a tornar o descanso insuportável dentro das tendas a partir das 8, onde era impossível dormir-se. Era ver gente a divertir-se no sujo canal, era ver corcundas nus a passear junto às mesas onde as pessoas comiam, era ver ladrões espancados por seguranças com tatuagens das SS, ladrões espancados por amigos, calções de banho roubados, sabe-se lá mais o quê. O Sudoeste foi um festival onde muitas bandas compreenderam a utilidade e necessidade do cowbell. Não sabemos quem começou primeiro a pegar nos sinos das vacas para fazer música, mas quem o fez deve ser canonizado. Como dizia Christopher Walken num famoso sketch de Saturday Night Live onde se parodiava os Blue Oyster Cult, “I’ve got a fever and the only prescription is more cowbell”. Sábias palavras, Christopher, sábias palavras. R.N.

· 04 Ago 2005 · 08:00 ·

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