Festival Sudoeste 2005
Zambujeira do Mar
04-07 Ago 2005

Palco Planeta Sudoeste
Factor Activo · Sagas feat. DJ Nel'Assassin · Hipnótica · Josh Rouse · Louise Rhodes · Mylo · Peaches
Palco TMN
The Thrills · Humanos · Underworld · Fatboy Slim


É uma e meia da tarde no parque de campismo da Herdade da Casa da Branca. No canal, os festivaleiros
aproveitam para se refrescar e passar o tempo com actividades promovidas pela organização do festival, com apresentadores brasileiros. R.N.

Palco TMN


The Thirlls
Na estreia em palcos nacionais, ficou provado que os Thrills têm um country-rock estupidamente alegre, que faz apetecer balançar o corpo e cantar aqueles refrães embrulhados em melodias orelhudas. É candura e melancolia em toda a força, numa banda irlandesa que parece habitar nalgum sítio com mais sol (daí que milhares e milhares de vezes os tenham situado na Califórnia, não só pela música). Algumas canções foram abençoados pelos deuses da criação musical (“Big Sur”, “Say it Ain’t So”) e isso ficou demonstrado pela reacção do público. Encetaram a mais forte abertura do palco TMN, e até a luz que ainda estava longe de desaparecer não estragou o espectáculo – pelo contrário, os cinco de Dublin moldaram o efeito crepuscular ao que tocaram. Foram 40 min divididos pelos álbuns So Much for the City e Let's Bottle Bohemia, no final ficou a vontade de os ver em palco próprio. T.G.

The Thrills

Humanos
Pó. Poeira. Gente a saltar ao som de "Maria Albertina", pó a levantar. Em palco está um supergrupo, uma das melhores coisas a ter acontecido à música pop portuguesa nos últimos anos. É, aparentemente, o seu último concerto, depois de se terem juntado para gravar os inéditos de António Variações e para três concertos nos coliseus de Lisboa e do Porto. Não há aqui erros de casting, o que há são excelentes músicos, três óptimos cantores, encarnando todos o espírito de Variações à sua maneira.
Uma banda que só dá quatro concertos devia estagnar, não evoluir. Tocar, receber o dinheiro, voltar para casa e ficar a coçar a barriga no sofá a ver a MTV. Mas não, dos coliseus para o Sudoeste, algo mudou. Introduções novas, novos arranjos, não tantos assim, mas ainda...e há cowbell a rodos.
Davide Fonseca é o puto do rock. A sua voz está melhor quando canta em português e quando não tem nada a ver com o que está a cantar. Como aqui ou em Irmão do Meio de Sérgio Godinho. É o que mais salta, o que mais dança, o que mais se abana em palco, com ou sem a guitarra. Manuela Azevedo põe-se no seu melhor jeito "Ó Rosa Arredonda a Saia", vai cantando, saltando, gritando tocando piano e cavaquinho. Camané é o fadista e o cantor cuja voz mais se aproxima da de Variações. É, contudo, mais refinado e mal se mexe em palco.
Ouvimos aquelas vozes e o jogo de guitarras angulares e nervosas, com batidas que nada devem aos Devo, mas sempre com o seu quê de portugalidade, algo como aquilo que Variações sempre disse que a sua música devia ser: "algo entre a Sé Braga e Nova Iorque". E há, sobretudo, aquelas canções. Óptimas canções, orelhudas, óptimos singles, que só não são sucessos maiores porque a rádio em Portugal é uma vergonha brutal.
O concerto arranca com "António", que é um original dos Humanos e um tributo a um dos maiores génios da música pop portuguesa. Durante a próxima hora e tal, ouviremos todos os êxitos do disco, mais covers de Sparks ("Sepáques? Quem são os Sepáques?", foi dito por muita gente dentro da plateia) e de outros temas de António Variações.
No encore, "Amor de Conserva" é precedido por Manuela Azevedo a dizer "Conservem isso que este é o nosso último espectáculo". E, no fim, "Maria Albertina" é repetido e transforma-se em "É p'ra Amanhã", um dos maiores clássicos de Variações. É o final dum concerto onde os artistas se divertem tanto quanto o público. É o final duma banda. E, quanto ao público, este é o mesmo público que ouve a RFM, a Rádio Comercial, a Best Rock FM, as rádios que se recusam a passar os Humanos. R.N.

Humanos

Underworld
Em nenhum espectáculo anterior os pés que saltaram no chão junto ao palco principal da Herdade da Casa Branca tinham feito tanto pó pairar no ar (nem a relva valeu de algo), e o concerto não fez por desiludir. Quase despidos de artifícios maquinais mas com efeitos visuais que o pó propagou, animaram e muito a noite de sábado (a que Fatboy Slim, logo a seguir, quebrou o ritmo). No palco, apenas uma mesa controlada pelas mãos de Karl Hyde (vocalista também) e Rick Smith de onde saíram os beats de house ou techno que animaram a multidão. Desfilaram alguns êxitos que ecoaram nas discotecas durante os anos 90, suficientes para animar quem estava ali para saltar, mas com sabor a passado. A música de dança pode estar já noutra frequência, mas ninguém quis saber disso. Afinal de contas, o Sudoeste é uma pista de discoteca. T.G.

Fatboy Slim
Há na teleologia algo que se relaciona com a música, com a de dança em particular: explica-se, estabelece-se e faz-se em função de uma finalidade. O problema, especialmente neste set que fechou a noite de sábado e se prolongou até à luz vinda de nascente, é que a finalidade que o DJ e os ouvintes procuram não é exactamente igual. Não é a mesma finalidade, na mesma ocasião. Ou estagna muito ou “bomba” (termo com afinidade ao estilo) quando devia parar para limpeza do suor... O mesmo diria um determinado escritor sobre a relação homem-mulher. Normam Cook, aka Fatboy Slim, começou mal e acabou melhor. Começou mal, porque deixou duas vezes seguidas os pratos irem abaixo, o som era sofrível e o ritmo demasiado descompensado. Amadorismo, para dizer pouco. Acabou melhor, por volta das 6 h, com um recinto que se tinha rendido e que só fez coincidir o abrandamento da dança com o final do concerto. No meio do público, no fim de um corredor que começava no palco e ficava a meio caminho da plataforma de controlo de som, Fatboy Slim teve pelo menos o mérito de trazer ali a banda que faltou ao cardápio dos festivais deste ano: os The White Stripes. Rezam as crónicas que a presença há dois anos no Super Bock Super Rock foi bem melhor. T.G.

Palco Planeta Sudoeste

Factor Activo
Os Factor Activo são da Covilhã e, nas suas próprias palavras, são "vendidos" como um colectivo de hip-hop sem "yo" e "hey" (eles próprios dizem). Começam com aproximações ao dub e ao reggae, com uma voz disparada, com linhas de baixo pungentes, teclados vintage. Uma banda de hip-hop que homenageia Eugénio de Andrade é algo raro, um colectivo de 14 anos que procura novos sons através dos teclados e sequenciadores que param de funcionar a meio do concerto, que toca para audiências mornas e a quem falta algo, mais alma. Há um trompete com surdina, aqui e ali, há rimas medíocres, há rimas sofríveis, há alguns bons momentos, mas esta interiorização do hip-hop não consegue ter muita vida. R.N.

Sagas Feat. Dj Nel'Assassin
Sagas, um dos MCs dos Micro, lançou um disco a solo este ano. Para celebrar isso, decidiu apresentá-lo ao vivo acompanhado pelo DJ Nel'Assassin, também dos Micro e também com disco a solo para apresentar/vender. Rimas e batidas a granel, todas de alto nível, Sagas canta e rappa com força, e Nel'Assassin é um óptimo DJ, tecnicamente falando. As batidas é que por vezes são pouco criativas, muito coladas aos cânones do hip-hop. Sagas traz primos dos Montecara e dos Mundo Complexo para ajudar à festa. Pediu uma atitude positiva a todos, quanto à vida e quanto ao concerto. R.N.

Hipnótica
Os Hipnótica são uma das melhores bandas portuguesas. Isto é, se lhes retirarmos o vocalista. Com uma base jazzy, programações, bateria, baixo/contrabaixo, harpa, trompete e Fender Rhodes, criam uma música que é, à falta de melhor palavra, cinemática. Toda a gente estava sentada no chão da tenda que envolve o palco Planeta Sudoeste, com beatas e sujidade à mistura... R.N.

Josh Rouse
Os Humanos, à mesma hora no palco principal, deixaram para Josh Rouse na tenda à entrada do recinto apenas os fãs mais declarados: à frente ouvi-se muita e muita gente a entoar todas as letras. A guitarra acústica foi posta de lado (ao contrário de outros concertos recentes em solo português) e o norte-americano, residente em Espanha, tocou, mais a sua banda, temas de 1972 e do último Nashville, num vê-se-te-avias de canções de uma magnificência melódica que não é habitual. Há quem diga que Josh Rouse concentra em si a soul de Memphis, o soft rock da década de 70, a pop barroca de 60 e ainda uma outra pop posterior mais dançável, e foi mesmo isso que desfilou naquela noite. Dança, move-se com estilo, cuida bem da roupa que leva, penteia-se de forma cool e impressionou quase toda a gente. A dada altura cantou “When I was a little baby, / A mamma's boy, / no one could save me / from those kids at school” e nós percebemos que o passado está bem longe. Come back, Josh. T.G.

Josh Rouse

Louise Rhodes
Toda a gente a conhecerá como a metade feminina dos Lamb, daí que as sonoridades mais acústicas por que enveredou na carreira a solo soem à partida um tanto estranhas. Apresentou o álbum Beloved One, com data de lançamento marcada para Outubro, feito de música descontraída no limiar da folk mais proverbial, com acompanhamento não-eléctrico: guitarras, contrabaixo, violino e percussão. A tenda estava meio vazia (tratava-se de um palco que acolheu bandas de cariz mais eléctrico e electrónico), longe da histeria que os concertos de Lamb provocaram em terras lusas. Mesmo assim, muitos fãs da banda em que Lou fazia duo com Andy Barlow (que esteve em Vilar de Mouros) cantaram “Gabriel” até ao limite das forças. É caso para perguntar: a música ainda não cansa? T.G.

Mylo
Destruir o rock'n'roll é a missão de Mylo, o escocês de 20 e tal anos que incendiou pistas de dança com “Drop the Pressure”. A pressão não baixou, mas houve problemas na bateria e no som, e no dia antes tiveramos The Juan Maclean, por isso não houve grande surpresa. Divertido, ainda assim. R.N.

Mylo

Peaches
A canadiana Peaches não sabe cantar. Não sabe tocar guitarra. Entra em palco após funk de favela carioca, para protagonizar um cabaré pornográfico, com lapdances, bandeiras em triângulo a dizer "XXX" e trepando às paredes do palco. Projecta vídeos de lésbicas com barba e strap-ons e Iggy Pop, com quem faz um dueto virtual. Nada de extraordinário, é tudo disparado, uma ou outra guitarra tocada (especialmente uma Flying V), um solo de teclado manhoso de brincar, ou berros e falsetes por cima de power chords. Divertido, mas musicalmente pouco relevante. R.N.

· 04 Ago 2005 · 08:00 ·

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