Metz / Cangarra
Galeia Zé dos Bois, Lisboa
13- Fev 2013
Nada como um pouco de fascismo para que um concerto comece finalmente a horas. Não, não é nenhuma apologia do mesmo, nem se está a minimizar a vergonha que é haver polícia a rondar as associações culturais lisboetas (leia-se: os tolos cheios de fé que muito têm feito pela vida da capital) à espera do erro, à caça da multa; mas que sabe bem apreciar descansadamente um concerto sem recear perder o transporte que nos leve de volta à estúpida casa nos subúrbios, sabe. Os Cangarra começaram a tocar passava pouco das 22h. Os Metz terminaram antes da meia-noite. Perdeu-se alguma coisa? Nadinha. E foi grande, como tinha obrigação de ser.

© Luís Martins - Far Out And Beyond

Cangarra, duo bateria-guitarra com ideia de espaço sideral. Ruído, muito, base rítmica entre os devaneios free e a propulsão motorik, chinfrineira genial e sempre imperdível. Cláudio Fernandes: pula, corre, sua que nem um louco, exercita-se e às cordas; Ricardo Martins: acrescenta as explosões que faltam ao riff, estardalhaço aqui e acolá, a pobre da bateria se falasse pediria piedade. Abriram o concerto apontando à loucura máxima do noise e por aí foram deambulando, num grau sempre elevado. "Banda do caralho", gritou-se, pois claro: é verdade. Venha mais.

© Luís Martins - Far Out And Beyond

Falava-se de fascismo? Falemos de liberdade: os Metz encontram-na em três acordes, em gritos de revolta contra um inimigo invisível, no ar matemático do guitarrista que se julgaria, em palco, estar contaminado pelo vírus rock, na toalha que serve para limpar o vidro embaciado (quem não conseguiu bilhete também merecia um bocadinho desta liberdade), na garrafa de Jameson que circula pelo público que ora se empurra mutuamente, ora surfa sobre cabeças de ambos géneros, ora berra you guys should listen to Foice Humana, ora detém na ponta da língua os get off! de, bem, "Get Off"; encontram-na, sobretudo, na enorme alegria que demonstram ter em simplesmente estar numa cidade desconhecida a tocar para uma sala esgotada, nas piadas quase que auto-depreciativas ("as nossas canções são todas sobre a mesma coisa: dançar, suar e estar com amigos"), em toda a surdez posterior. Pouco após uma "Wasted" surge "Headache" e achamos graça à ligação; o encore dá-se com uma "Rats" absolutamente avassaladora, com a guitarra roubada aos Cangarra - e que acabou, tal como a que aos canadianos pertencia, com uma corda partida -, e entregamo-nos de corpo e alma à violência do power trio. Não os ouçam porque tem o selo de qualidade Sub Pop ou Pitchfork: ouçam-nos porque dentro em breve voltarão até nós e vós querereis fazer parte desta bela família que hoje passou pela Zé dos Bois. Até porque eles têm jeito para o marketing subliminar: tantos pedidos para que o público suasse só poderiam terminar com a compra de uma sweat. Viva a liberdade.

© Luís Martins - Far Out And Beyond
· 14 Fev 2013 · 17:58 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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