Oeiras Alive!07
Passeio Marítimo de Algés, Algés
8-10 Jun 2007

09/06

Triangulo de Amor Bizarro · Balla · The White Stripes · The Smashing Pumpkins

Triangulo de Amor Bizarro
É um fenómeno de natalidade interessante que merece investigação: quando nasce uma bebé numa maternidade urbana da vizinha Espanha, é frequente cantar um refrão das Sleater Kinney em vez de largar um berro estridente de recém-nascida. O Triangulo de Amor Bizarro é mais uma prova de que na Espanha os candidatos ao catálogo da Kill Rock Stars são demasiados. A menina inicia as hostes na frente, ao cantar e arrancar ao baixo uma avalanche de graves que corrói quase tudo à volta. Depois é a vez do guitarrista e vocalista, impressionantemente semelhante a Dave Portner dos Animal Collective, tomar as rédeas e balancear o andamento das coisas até a um indie mais irritadiço que manifesta alguma imaginação a espaços. Um grupo de conterrâneos, a aguardar ansiosamente por Las Rayas Blancas, dizia que a débil condição do som não estava a favor do trio. Se o intercâmbio ibérico funcionar bem, ainda podemos ter os Linda Martini a actuar em Benicàssim.

Balla
Bala é um daqueles sprays milagrosos que eliminam a ferrugem aos materiais metálicos e recuperam todo o tipo de instrumentos. Balla é o nome de baptismo escolhido pelo desde sempre prodigioso Armando Teixeira para actualizar aquilo que descobre aos baús da golden age conforme o seu entusiasmo e gosto. A Grande Mentira acaba por ser a verdade de uma tarde amena que a seu favor até tem o romantismo fluvial conferido pelo rio Tejo. Armando Teixeira ainda é o crooner com sentido melódico, o par de pernas longas revestidas por umas calças negras onde não cabe sequer mais uma moeda de 5 cêntimos, maestro de uma banda rock gerida por uma medida play it cool, um sedutor em defesa da pinta que possa preservar a palavra portuguesa enquanto arma na conquista de uma Geri Halliwell (a mais devassa das Spices) num episódio soft-core do Verão Azul (20 anos mais tarde, caro inspector). Com a versão de “Vídeo Maria”, original dos GNR, tornam-se mais evidentes as semelhanças físicas mantidas entre Armando Teixeira e Rui Reininho. Por sua vez, com a apropriação de “Oub’lá”, ao cancioneiro putrefacto dos Mão Morte, verifica-se a permuta de Adolfo por Armando, de negligé negro por colete dandy, de uma história nocturna de dependência por um conto de tentação à medida dos Balla. Pelo fim da prestação, alguma publicidade montada em andas teatralizava entre o público o confronto entre o diabólico e o angélico. O concerto de Balla ficou-se pelo apetecivelmente discreto e um neutro ameno. E faltou Le Jeu que é um disco que faz apetecer morder a Balla.

The White Stripes
São inseparáveis companheiros, no revisitar das paragens mais malditas do rock americano, o estranho frenesim eléctrico de Jack White (na guitarra e teclados) e a invulgar simplicidade de Meg (na bateria), sua irmã por afecto. A química daí resultante serve de combustível a uma prestação que, no que respeita às observadas ao palco maior, terá sido das mais humanas, arriscadas e passionais (sem que esta última característica tenha sido sequer afectada pelo estilo obligé de Meg White). “Icky Thump”, em representação do novo álbum homónimo, é tudo isso em estado amadurecido, tal é a quantidade de oscilações – nem que seja na voz de Jack White - que vai sofrendo um dos singles mais complexos da dupla. Depois, “Jolene” e “We’re Going to be Friends” traduzem-se em momentos de uma serenidade tal, que perdem fundamento quaisquer suspeições de que o nome White Stripes pode ser sinónimo de linhas de cocaína. A cover “I Just Don’t Know What to do With Myself” não é a mesma sem Kate Moss num varão, mas mantém o concerto ao mesmo nível elevado que se descobriu à sua inteira duração. A inevitável conclusão é requisitada espontaneamente pelo público que em coro entoa o riff de maior durabilidade conhecido aos últimos anos de música: “Seven Nation Army”, pois claro, e a sua estrutura que, depois de queimar calorias em refrão desenfreado, regressa sempre à estaca zero dos tais acordes viciantes. Aposta ganha.

The Smashing Pumpkins
Por mais duro que seja admiti-lo, a verdade é que Billy Corgan parte triplamente derrotado para este regresso ao activo dos Smashing Pumpkins que, no seu pico, foram a tinta e pincel de muito sonho juvenil vivido na década anterior. Sonhos que não surtiram o efeito desejado nuns pessimamente geridos Zwan, num relativamente ignorado disco em nome próprio e num anúncio de página inteira colocado na revista Variety, em que Billy Corgan apelava a que lhe fosse devolvida a banda de sempre e os seus quatro membros originais (contando com o próprio). Contudo, o guitarrista James Iha e a baixista D’ Arcy não acederam ao pedido (talvez por não pactuarem com a importância que foi ganhando o excêntrico vestuário na apresentação global da banda de Chicago). Em Algés, viram-se apenas Billy Corgan, o baterista Jimmy Chamberlain e três ilustres desconhecidos que preencheram as vagas sem desonrar os ocupantes passados ou gerando enorme saudade. Bem pelo contrário, acrescente-se, já que manifestaram o entusiasmo que muito faltou ao concerto da formação clássica no Estádio do Restelo (o último por cá). Assim sendo, tudo apontava para que a reconquista do público perdido obrigasse a um milagre divino, mas a actuação dos Smashing Pumpkins mereceu dois que foram decisivos para que mais pesasse o braço positivo da balança: a abertura com “Today” mereceu a chegada sincronizada da chuva, que a transformou num momento absolutamente sublime, e a larga amostra do próximo álbum, Zeitgeist, chegou para descansar todos os que temessem um terceiro Machina.

Pelo que foi dado a escutar do disco anunciado para a data cabal de 7 de Julho de 2007, incluindo uma longuíssima suite instrumental que alongou o encore, Zeitgeist pode significar um regresso mais refinado e cinemático ao caos épico de “Tales of a Scorched Earth” ou “X.Y.U”, peças devastadoras do duplo Mellon Collie & The Infinite Sadness. Mas não foram as faixas de Zeitgeist que arrancaram as mais intensas reacções a um público com mais zeros que o extracto bancário do Sr. Belmiro de Azevedo. Foram sim paragens obrigatórias – ou granadas nostálgicas – como “1979”, “Tonight, Tonight” (com Corgan a repetir o típico apontar de dedo ao público quando canta As I Believe in You) ou, já em encore, “Cherub Rock” que vieram a desenvolver a empatia entre os presentes e o calvo gigante que, afinal, é auto-suficientemente os Smashing Pumkins. A devoção parece ter manifestado um ligeiro renascimento no Oeiras Alive. Durante grande parte do concerto, os ecrãs exibiram uma jovem loura que tinha fontes lacrimosas no lugar dos olhos. Razão mais que suficiente para subverter a fórmula a um velho sambinha e lembrar que é dos megalómanos que as chorosas gostam mais.

· 08 Jun 2007 · 08:00 ·
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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