Cristina Branco
Teatro Infanta Isabel, Madrid
06 Mar 2007
Na parte de fora do Teatro Infanta Isabel, na zona de Chueca, pouco ou nada se falava em português – antes e depois do concerto. A agitação era grande e já lá dentro percebia-se porquê – a belíssima sala esteve muito perto de se encher para receber Cristina Branco. O concerto inseria-se numa digressão que tinha como principal objectivo promover o CD e DVD Live, onde Cristina Branco interpreta as suas canções e temas de Amália Rodrigues. Espanha abria os braços a Cristina Branco na Corunha, Vigo, Alicante, Girona, Madrid e Santander, trazida pela mão da Syntorama, uma promotora do País Basco que conta quase todos os meses com concertos de nomes portugueses em território espanhol.

A partir do momento em que Cristina Branco entrou em palco, num belíssimo vestido preto, a expressão “emoção à flor da pele” fez todo o sentido. “Tive um coração perdi-o”, iniciada por José Manuel Neto (na guitarra portuguesa), teve o dom de instalar em palco uma magia impalpável que só desapareceu quando as cortinas imaginárias do palco do Teatro Infanta Isabel se fecharam: “ Quem me dera ir embora / ir embora sem voltar! / A morte que me namora / já me pode vir buscar”. Desde cedo se percebeu que a voz de Cristina Branco continuava intocável como sempre (é uma das melhores de Portugal) e que José Manuel Neto está cada vez melhor na missão de dominar a guitarra portuguesa. Ricardo Dias (no piano), Alexandre Silva (na viola) e Fernando Maia (na viola-baixo) fechavam o quarteto de músicos que acompanharam Cristina Branco. Fizeram-no logo depois na belíssima “Trago fado nos sentidos”. A homenagem a Amália Rodrigues não poderia ter começado de melhor forma.

Ulisses entrou em cena com a sempre emotiva “Sete Pedaços de Vento”, e depois com “Navio Triste”, de Vitorino. Mais tarde viriam “Porque me olhas assim” e “Redondo Vocábulo” (só com piano e voz), depois de um intenso instrumental conduzido por José Manuel Neto que muito entusiasmou a plateia. Voltando a Amália, impressionou sobremaneira “Havemos de ir a Viana” pela vitalidade da interpretação. “Cansaço”, apresentada como fado-tango, “Rosa” de Pixinguinha e “Formiga Bossa Nova” mostram Cristina Branco a aventurar-se por territórios mais ou menos distintos. Mostram que esta é uma fadista que brinca com a tradição. Mas como fadista é sempre fadista, “Meu amor é marinheiro” não deixou de marcar presença lá para o final da actuação.

Para um dos dois encores da noite estava reservado um momento especial. “Tudo isto é fado”, com a melodia a ser entoada pelo público. E foi aí que Cristina Branco descobriu e apontou alguns portugueses – conhecedores do refrão: “Almas vencidas / Noites perdidas / Sombras bizarras / Na mouraria / Canta um rufia / Choram guitarras / Amor ciúme / Cinzas e lume / Dor e pecado / Tudo isto existe / Tudo isto é triste / Tudo isto é fado”. E este foi apenas um dos muitos momentos mágicos do concerto. No final todos pareciam rendidos. Os comentários ouviam-se em castelhano e eram bastante elogiosos. Muitos foram os motivos para acreditar que Cristina Branco é, neste momento, uma das maiores e melhores embaixadoras musicais portuguesas no estrangeiro. Em Espanha ou na Holanda, em França ou em Portugal, Cristina Branco merece o mundo.
· 06 Mar 2007 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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