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Frikstailers Extrasolar

2019
Nacional Records


Seria demasiado redutor ceder à tentação do patriotismo pateta, do eu bem vos disse crítico, e reduzir Extrasolar a "Afrotrip", o primeiro single dele retirado e que é, segundo os Frikstailers, inspirado «pelos sons do underground lisboeta». Seria, porque a questão do «underground lisboeta» começa a saturar, tal como a propaganda turística em torno do rótulo «nova Lisboa». Seria, porque os Frikstailers olharam para essa Lisboa como voyeurs, e a sua opinião - ou visão - não nos interessa, ou não devia interessar, absolutamente nada. E seria porque "Afrotrip" nem sequer é a melhor malha do disco (boa, ainda assim).
 
Antes dela há todo um cosmos por descobrir, um realismo mágico argentino que foi pregado aos céus como as estrelas de um terraplanista que não levantou nunca o seu pescoço. Há "Cosmic Trip", que parece disco nórdico, mas onde encontramos - sabe-se lá porquê; talvez os samples, formando cantares estranhos - algo de escandalosamente "tradicional", uma imagem de um indígena construindo um foguetão; e logo a seguir há a furiosa "Brinca", que faz a ponte entre Atalanta e Mictlantecuhtli, trap para se dançar no topo do Templo Mayor.
 
Extrasolar não é uma fusão rara - elementos tradicionais aliados a uma certa ideia de futuro, tudo sob o jugo da electrónica mais dançável -, mas funciona tão bem ou melhor do que qualquer outra, deixando de lado a ideia de novelty para construir uma linguagem rica e, acima de tudo, cativante. Basta observar "Telotihuán", "Heridas" ou "El Mito" para o perceber, juntamente com qualquer uma das anteriores. Só não se escreva que fazem parte de algo como «a nova América Latina». É que não nos queremos enjoar nem queremos que eles se estraguem.


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
26/04/2019