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Noname Room 25

2018


Era uma vez menina com problemas com a mamã, pirralha a borrifar-se para os estudos, odiar a escola Preparatória, desagradar-lhe a leitura, ignorar a música, passar o tempo a ver televisão; garota que, admite Fatimah Warner hoje com natural humor, preferiu naqueles tempos ser a "palhacinha da turma", ser expulsa um sem número de vezes, a passar pelo ridículo de ser a "atrasadinha" a ler diante dos colegas de turma. Em relação a essa fase pueril, confessou também que, perante a enormidade do Universo, não percebia porque passava o seu tempo numa "caixinha" (a sala de aula) a engolir treta curricular "ficcionada".

Fatimah teve uma epifania na fase do Secundário: no You Tube descobriu vídeos da velha série da HBO, Def Poetry Jam, apresentada por Mos Def, e logo se tornou obcecada por aquela coisa do… poetry slam. "This is the most amazing fucking thing!", pensou Noname na altura, e relembrou-o no presente no decorrer da entrevista que timidamente deu ao The Fader em Setembro último, e de onde foi possível, a nós aqui no Bodyspace, perceber um pouco melhor a alma por detrás deste sublime monumento poético chamado Room 25.

Nascida em Chicago há 26 anos, recatada, senhora domadora do verbo – tal ter sobressaído em Acid Rap de Chance The Rapper –, Noname nada mais pretende ser senão aquilo que se considera: uma pessoa normal; uma que recusa rótulos pró ou anti qualquer-coisa só porque tem uma perspectiva íntima sobre a realidade que a ladeia. (E tristes tempos em que vivemos em que tudo tem de ser ou branco ou preto!) Os seus desabafos, e tem vindo a sublinhar isso, não têm intencional tento político, eles saem naturalmente, fluem eloquentemente, rimas que são lembranças/ reconstituições de experiências pessoais passadas, umas mais memoráveis que outras.

Room 25 é um inteligente resumo do diário pessoal de Fatimah nesta fase adulta da sua vida (já catártico; porque não?), um sumário em que o jazz mais sedutor, a neo-soul (há que admitir as saudades que temos de Erykah Badu ou Ursula Rucker), o hip-hop aveludado (de Common?) conluiem – muito pela mão de Phoelix, patrício da autora – para estacar uma estrutura, quais carris, onde a carruagem da requintada poesia de Noname role directa, sem abanos, à essência da existência – dela, e de todos!

Depois da agradável viagem que foi a mixtape Telefone em 2016, Room 25 – álbum, não um aglomerado de retalhos – é ENORME. Enorme apesar dos seus 35 minutos. E enorme por genuinamente honesto, apesar de em tempos Fatimah ter sido a "palhacinha" que se achava sem nada para dar, e não queria dar o braço a torcer. “Sometimes I’m like, Ugh, I’m being too honest, maybe some things I should hold on to”. Não, jamais. Partilha tudo o que te vai na alma, sister!


Rafael Santos
r_b_santos_world@hotmail.com
19/10/2018