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Loto The Club

2004
Universal


Há discos e bandas das quais nos apetece logo não gostar. É uma necessidade que transcende o ouvinte e que se coloca nas regiões mais teimosas do cérebro. Admitam, vá lá, melómanos deste mundo, que já sentiram isto algumas vezes. Frequentemente não gostamos - ou fazemos os possíveis por isso - de uma banda por motivos que são exteriores à música. Nestes casos, tudo vale para justificar o nosso ódio ou antipatia: penteados, roupas, capas dos discos, editoras... marca das cordas da guitarra. Posto isto, os Loto configuram um caso típico deste sentimento. Explico: eu gostava de não gostar dos Loto. Não é que goste muito, mas gosto um bocadinho. E não queria que fosse assim. E tenho bons motivos para isso.

Os Loto são um caso típico de tanto-mudamos-que-havemos-de-acertar. Eles próprios o dizem: começaram a fazer brit-pop, passaram despercebidos, compraram novos instrumentos e fizeram um EP Swinging on a Star, muito devedor da canção electrónica-melosa à Air e, finalmente, sentindo os ventos de recuperação oitentista, voilá, eis os Loto atrás de teclados, sintetizadores e vocoders. A roupa também mudou: atentem no blazer negligé a deixar antever a t-shirt dos MC5 novinha em folha, no vídeo de "Back to Discos". A julgar pelo airplay dos singles de The Club, os Loto parecem ter acertado.

Musicalmente, os Loto nada têm a acrescentar. Integram-se agora no movimento de revisionismo musical da pop dos 80's, com os New Order à cabeça. Não sou eu que o digo, são eles próprios (acrescentando, entre outros, Air e Beck, mas esses tempos já lá foram...). Situam-se perigosamente no limbo que separa o "cool" do "foleiro". Frequentemente ouvem-se batidas de techno manhoso e vozes soul de - choque! - Joana Almeida, concorrente do programa-lixo "Ídolos", metidas a martelo (como em "The Club"). As letras versam sem excepção a festa, os bons sentimentos, a boa disposição eterna que até enjoa, por vezes com versos acéfalos ("I love my music electro loud but I'm for Portugal", em "Future Retro"). Há uma balada chatíssima ("Units") que obriga a mudar de faixa. Há um tom mais dub em "Disco Exotica" (6:33 de sonolência). Há um optimismo irritante em "So Happy Together" (por falar nisso, que deu às bandas portuguesas para desatarem todas a fazer temas solarengos?).

O "problema" é que nem tudo é mau em The Club. "Back to Discos" e "The Boy", os dois singles, são fortíssimas canções electro-pop. A primeira é dona de um refrão viciante e é altamente New Order (elogio). "The Boy" é mais insinuante e menos pastilha elástica. Ambas são óptimas canções, tendo em conta o seu propósito único de fazer dançar e bater o pé. "My Guitar" é um tema razoável, não fossem os "pa pa pa pa". "Shores", a canção mais diferente do álbum, conta com a voz nasalada e guitarra acústica de Nuno Sousa dos Stowaways e é um feliz fim de disco, depois de uma série de canções inúteis. Se The Club tivesse mais algumas canções fortes, seria um bom disco. Assim é apenas dois singles, algumas canções e uma mão cheia de temas para encher o espaço tido como recomendado para um disco compacto.


Pedro Rios
pedrosantosrios@gmail.com
13/06/2004