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Serena Butler From The Cloud To Our Bodies EP

2017


Serena Butler é uma anomalia. Não, essa não é a terminologia correcta; talvez seja o futuro. Um fantasma, um anjo sem sexo e sem género, sendo que a sua identificação requer uma nova linguagem que se possa fielmente adaptar àquilo que elx é. É a derradeira pedra lançada contra a testa do mundo patriarcal e recorre a um género de música, o techno, que possa acompanhar esse mesmo lançamento - ou que se afirme como a evolução de um tipo humano. Não se escreve "género humano" porque aqui ele parece não existir. Ou, melhor dizendo, não quer existir.

Serena Butler é diferente e encara o techno como a linguagem do futuro mesmo que, de seguida, designe a música como sendo exactamente igual ao tipo humano: sem géneros, sem fronteiras, sem delimitações. Mesmo que esta ideologia particularmente anarca, que este mission statement, nos leve a achar-lhe alguma piada, a verdade é apenas uma: Serena Butler faz dub techno como muitxs antes delx o fizeram. Querer acelerar em direcção ao futuro apostando numa música do passado não é hipócrita; é apenas ingénuo.

O que não quer dizer que a música de Serena Butler é má ou aborrecida; é só que elx parece ter apostado mais em esconder-se no meio das palavras que no meio dos sons, o que para um/a artista que vive para a música não faz grande sentido (para além de ser extremamente complicado). Resta a instrospecção presente em temas como "Your Past. Your Future. Your Very Light" ou mesmo "Where Fire Resideth, Shadows Twist And Shrivel", esta última sem beat e mesmo sem electrónicas: apenas vozes operáticas em registo ambient. Por outras palavras: a sua luta é louvável, mas seria grandiosa se conseguisse, efectivamente, mostrar-nos o futuro.


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
20/09/2017