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Jesu & Sun Kil Moon Jesu / Sun Kil Moon

2016
Caldo Verde Records / Rough Trade


Não adianta negar que este era um dos álbuns mais aguardados do ano. De um lado, um dos maiores contadores de histórias em regime folk dos últimos anos, figura tão polémica quanto genial e autor do clássico-instantâneo, de coração dorido, Benji; do outro, um dos homens mais respeitados do circuito metaleiro, desde que o seu nome começou a circular de boca em boca em 1987 - com a edição de Scum, dos Napalm Death -, ele que também já mostrou ser capaz de expandir os seus horizontes para lá do peso, através de projectos como Techno Animal ou Pale Sketcher. O encontro fortuito prometia dar frutos, mas acabou por mirrar com o tempo invernoso.

Não é que este álbum que junta Jesu a Sun Kil Moon seja péssimo. Aqui e ali há um pedaço bonito de uma ideia que poderia ter corrido bem, mas que acabou por escorregar nessa pista de gelo mental que parece ter-se apoderado de ambos músicos. À partida, a spoken word de Kozelek, honesta e directa ao osso, seria o par perfeito para os desvarios sónicos de Justin Broadrick - o coração tremendo com a força do reverb - mas não se revela mais do que insossa. Sendo que "insossa" é, talvez, uma caracterização demasiado fraca para descrever Jesu / Sun Kil Moon; o álbum é mesmo uma gigantesca erecção provocada pelo encher matutino da bexiga, mas que no final não oferece a sensação de satisfação e o tradicional arrepio na espinha que o seu esvaziamento provoca.

Que correu, então, mal? A falta de harmonia, exclusivamente, um bocado como meter ketchup no iogurte. O Kozelek que a solo soa ao homem amargurado pela vida ao mesmo tempo que tenta manter uma face cómica é, aqui, uma vergonha alheia de meia-idade a tentar desesperadamente manter-se jovem e conectado com o zeitgeist, enquanto as guitarras de Broadrick, ao fundo, procuram a revolta mas esbarram na enorme parede do aborrecimento. Mesmo que as letras, pelo menos, se mantenham imaculadas, é a sua interpretação que desilude - não obstante os risinhos durante a leitura da carta em "Last Night I Rocked The Room Like Elvis And Had Them Laughing Like Richard Pryor", que ainda nos fazem esboçar um sorriso. Amarelado, mas um sorriso.

No meio de tudo isto, é o "regresso" à folk de "Fragile", canção que segue a mesma linha confessional de Benji e Universal Themes que desponta como o momento mais interessante de um álbum que, reconheça-se, mostra que tanto Kozelek como Broadrick não tiveram qualquer medo de arriscar algo novo. O problema é essa novidade ser um corpo demasiadamente estranho para que consigamos encontrar aqui alguma espécie de sentido. À semelhança dos primos afastados Lulu e Soused, também eles colaborações inesperadas que acabaram por resultar num dos maiores montes de estrume do rock n' roll (o primeiro) e numa salganhada sonolenta (o segundo), Jesu / Sun Kil Moon irá figurar, inevitavelmente, na categoria porquê? que atinge tantos e tantos casamentos entre músicos de valor. É pena. Mereciam mais - mas também deviam ter feito mais.


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
16/02/2016