bodyspace.net


Cavalheiro Mar Morto

2015
PAD


Ao longo de toda a discografia de Cavalheiro, desde Primeiro, de 2010, até Trégua, de 2013, desde a canção magnífica que é "Bom Jesus", em ambas versões, passando pela reformulação que fez de "Desire Lines", dos Deerhunter (em que teve o condão, só reservado aos grandes artistas, de fazer uma banda de merda soar bem), a amargurada música ali presente - mesmo que o autor negue uma amargura pessoal - transmite-nos a sensação de que há uma personagem, autobiográfica ou não, a procurar significado e salvação dê lá por onde der, seja através da vida, do amor, ou mesmo de Deus, como um ateu ruminando a morte.

2014, para Cavalheiro, foi um ano de morte figurada, o primeiro desde 2010 em que não lançou qualquer música, devendo-se isso a uma fractura no braço que o obrigou a repousar e a fisioterapia prolongada. Para um artista, especialmente um músico que faz da guitarra o seu modo de expressão, não deverá haver tragédia maior - e na tragédia, é certo e sabido que todos nós procuramos um sentido, de forma a poder compreendê-la. No caso de Cavalheiro, o sentido foi Mar Morto - o lugar onde não nos podemos afogar, mas onde também não conseguimos viver, a metáfora ideal para o período que atravessou.

É lógico que, desta forma, com a vida novamente a circular nos eixos, o músico nos dê um álbum bem mais acelerado do que os trabalhos anteriores, com toda a garra que lhe ficou presa no goto durante um ano a soltar-se em electricidade rock. Rock, mas também pop, radio-friendly no melhor dos sentidos, com a pujança de "Este Dia" a assumir-se, logo a abrir, como o melhor tema aqui presente, sem querer descurar o blues afiado de "Armadilha" ou a bonita "OAZ", que termina o disco da melhor forma possível, ecos ao longe ajudando a voz e o verso. Afinal, o Mar Morto brota de vida.


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
25/01/2016