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Balla Le Jeu

2003


“Le Jeu” é o segundo disco de Balla, uma das muitas encarnações de Armando Teixeira, o mesmo que é (ou foi) parte integrante de Ik Mux, Bizarra Locomotiva, Boris Ex-Machina, Da Weasel e Bulllet. Este álbum de Balla surge quase um ano depois de “The Lost Tapes”, de Bulllet , considerado por alguns como um dos melhores discos dos últimos anos produzidos em Portugal. Isto significa que para muitos esse continua a ser o seu álbum de maior relevo, sendo este “Le Jeu” disco que não se eleva ao mesmo nível. Mas, se tivermos em conta que a média dos trabalhos editados por Armando Teixeira está uns pontos acima da concorrência, é fácil perceber porquê, até porque, como se sabe, as obras-primas não nascem como cogumelos. Despistando isso, “Le Jeu” é pop, é ”chanson française”, é erotismo, é electrónica e tudo o mais que um disco de canções sem complexos pode sugerir. Primeiro, porque se apoia nas bandas sonoras de filmes eróticos das décadas de 60/70/80 e depois porque tem canções, sobre tudo e sobre nada, onde se desafiam, mais uma vez, as barreiras estilísticas. Além de tudo isto, Armando Teixeira continua a travar um certo gosto pelo humor, simbolismo e devaneio, que encontra muito poucos adeptos em Portugal. Nesse sentido, a brincadeira com a capa (glosagem do disco “Nº 2” de Gainsbourg, também experimentada no álbum de Nathaniel Merriwether, “Lovage”) encerra em si uma clara ideia de álbum conceptual, que é devedor simultaneamente daqueles ambientes (às vezes decadentes, às vezes não) da música francesa e italiana de há duas ou três décadas atrás, como também de um certo gosto cosmopolita em partilhar os momentos a dois. A dois porque este é um disco a duas vozes: a do próprio Armando Teixeira e a da até aqui desconhecida Sylvie C., mas também porque existe uma certa carga libidinosa para ser desfrutada com alguém por perto.

“Le Jeu”, assim sendo, já nem confirmação é. Engloba um conjunto de retalhos onde música negra e latina se agarra à electrónica de um “Moon Safari” dos Air ou às canções (também quase sempre a dois) de um “Lovage” de Nathaniel Merriweather. São samples e orquestrações soul, mas sobretudo pop. A pop de “A Meu Favor”, de “Quero Ser o Teu Volkswagen” ou de “Un Jeu Courtois”. Apetece sempre mais neste grande quadro feito de fatos com estilo, rosas, cigarros, gravatas amarelas, sapatos e sofás vermelhos e pistolas com cabos de madeira. Em “Lovage”, era o chill-out com pitadas a la Mike Patton e Jennifer Charles que imperava, e em “Nº 2” de Gainsbourg o que ordenava as regras do jogo eram certos ambientes de cabaret e volúpia jazzística. Explicar este disco como uma possível confluência entre essas duas esferas será uma tarefa muito pouco conveniente e até mesmo duvidosa, mas poderá ser um bom ponto de partida para a compreensão do som de “Le Jeu”. Jogo de cumplicidades, de ilusões, de dicas e de concílios. Mas, sobretudo, um muito bem elaborado jogo pop.


Tiago Gonçalves
tgoncalves@bodyspace.net
23/06/2003